Carta Aberta ao Senado Federal |
EM REPÚDIO À DECLARAÇÃO DO SR.
CLAUDIO DE MOURA CASTRO
Brasil, 26 de outubro de 2013.
Nós, ativistas do Movimento
Nacional dos Direitos Humanos, de diversas entidades e profissionais do setor
viemos repudiar veementemente o pronunciamento machista e preconceituoso do Sr.
Claudio de Moura Castro, economista, colunista de uma revista, professor
especialista em educação e presidente do Conselho Consultivo da Faculdade Pitágoras,
em audiência pública, realizada no dia 22 de outubro de 2013, na Comissão de Educação,
Cultura e Esporte do Senado Federal, em Brasília/DF.
A audiência pública supracitada
tinha como pauta principal o novo projeto do Plano Nacional Educação (PNE).
Nesta ocasião, o Sr. Claudio defendeu e sugeriu que o PNE assegurasse “a
criação de um bônus para as ‘caboclinhas’ de Pernambuco e do Ceará que
conseguirem se casar com engenheiros estrangeiros, porque aí eles ficam e
aumenta o capital humano no Brasil; aumenta a nossa oferta de engenheiros”.
o vídeo com a fala polêmica
Ao ouvirmos e lermos esta
declaração, cujas palavras parecem ser articuladas sob o fio do preconceito e
do desrespeito aos direitos humanos, ficamos estarrecidos e indignados com
tamanho preconceito e desvalorização do Estado público e democrático de
direito, tão tardiamente assegurado por marcos políticos e legais no Brasil.
A Constituição Federal de 1988
afirma, no Art. 5º, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança
e à propriedade”. Mais especificamente, os incisos I e IV afirmam:
I - homens e mulheres são iguais
em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
V - é assegurado o direito de
resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral
ou à imagem.
As marcas da desigualdade no
Brasil são oriundas de um processo de colonização que dizimaram indígenas,
escravizou e comercializaram negros, dividiu o País em regiões ricas e pobres,
atrasadas e modernas e, sobretudo, construiu uma prática histórica – que viceja
até hoje – de clientelismos, colonialismos e extermínios dos indígenas, negros,
nordestinos e pobres. Assim, as conquistas de referenciais democráticos
convivem, anacronicamente, com discursos e projetos conservadores,
preconceituosos e, por isso, autoritários.
Somos homens e mulheres negros,
indígenas e caboclos. Compartilhamos do sangue e do suor dos povos que
resistiram e resistem bravamente à escravidão, à miséria e ao preconceito. Além
disso, somos seres sociais, sujeitos históricos, homens e mulheres com desejos,
sonhos e capacidade de construir a história, quer vivamos nas regiões Norte, Nordeste,
Centro-Oeste, Sul e Sudeste do País. SOMOS SUJEITOS DE DIREITOS!
A construção sócio-histórica de
cidadania, consolidada neste País, é traduzida por vários documentos. Dentre
eles, estão as Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos, a qual
afirma a educação em direitos humanos como “um dos eixos fundamentais do
direito à educação, que se refere ao uso de concepções e práticas educativas
fundadas nos direitos humanos e em seus processos de promoção, proteção, defesa
e aplicação na vida cotidiana e cidadã de sujeitos de direitos e de responsabilidades
individuais e coletivas” (art. 2º da resolução nº 1, de 30 de maio de 2012, do
MEC).
Enquanto defensores dos direitos
humanos, a nossa luta é, portanto, pelo amplo reconhecimento da condição de
sujeito e de igualdade a todos, recusando qualquer forma de preconceito e
discriminação, inclusive as diversas falas públicas que se utilizam de argumentos
preconceituosos, coisificam e violam a integridade humana de homens e mulheres
– sendo estas últimas historicamente vítimas de violências e preconceitos no mundo
e no Brasil.
Por isso, solicitamos ao Senado
Federal, instituição de extrema relevância para o cumprimento dos direitos e
deveres assegurados pelo estado democrático de direito, que leia, no plenário,
esta carta de repúdio.
A educação, enquanto ato
histórico e humano, tem de ser construída sob valores e princípios
democráticos, de justiça e criticidade. Qualquer posicionamento que viole a dignidade
humana, a igualdade de direitos, o reconhecimento e a valorização das diferenças
e das diversidades não pode ser incorporado às práticas educativas e cidadãs.
Na luta por um mundo mais justo e
igualitário,
Atenciosamente,
Baixe o pdf com a carta