por Francisco Moreira
Os recentes ataques em escolas no
Brasil, bem como algumas tentativas desarticuladas e a disseminação em massa de
conteúdos alarmistas nas redes sociais tem causado uma onda de preocupação e
apreensão de pais, professores, alunos e autoridades. Diante do problema, que é
real e afeta a toda população começam a surgir, de um lado a apropriação
política dos ataques, visando criticar essa ou aquela politica desse ou daquele
governo; por outro, soluções mirabolantes ou apressadas baseadas em puro
achismo e na emergência de dar uma resposta, política principalmente.
O aumento da verba destinada ao
aumento de rondas escolares a serem efetuadas pelas polícias militares surge
logo como uma resposta mágica que irá acabar com o problema. Não vai.
Primeiro porque não há como as polícias militares disporem de efetivo para
realização do policiamento ostensivo e concomitantemente das rondas escolares
de forma exclusiva, ou seja, ainda que se aumente a verba, não há pessoal e
meios para tal. Basta lembrar que a maioria dos municípios, exceto as cidades
maiores, quando muito, possuem dois policiais por turno de serviço. Na prática
as rondas serão realizadas com algum ajuste no cartão-programa (roteiro) das
guarnições, sem detrimento ao atendimento de outras ocorrências emergenciais. Vale
aqui lembrar que várias polícias militares no País já possuem há anos programas
de policiamento comunitário escolar voltados a segurança dos estabelecimentos
de ensino.
Restringir conteúdo nas redes
sociais também é algo apontado como uma solução, porém, além do gritante
problema de como isso será feito de forma a não se configurar como censura ou
impedimento à livre expressão ainda é um mistério a ser desvendado e um
potencial perigo futuro a própria democracia. Claro que as redes sociais merecem
uma atenção especial justamente por essa capacidade de expandir informações
(verdadeira ou não) de uma maneira ferozmente eficaz e que deve sim possuir
regras legais e de conduta.
Lembrando ainda que não algo tão
fácil assim restringir a disseminação de conteúdos pela internet, a web é quase
um organismo vivo e mutável, que se adaptar muito rapidamente a tentativas de
limitações, basta relembrar casos recentes em que determinado mensageiro online
foi bloqueado e logo surgiram inúmeras alternativas que fizeram as informações
circularem como se nada houvesse ocorrido. A multimilionária indústria de
Hollywood, por exemplo, vive tentando ´barrar vazamentos sobre suas produções
ou evitar que seus filmes sejam pirateados mundialmente e até o momento não
conseguiram paralisar essa demanda, fecham um site, outros dois ou três são
abertos e continuam a espargir material.
Jogar a culpa para essa ou aquela
política de governo (presente ou passado) é apenas retórica tentando angariar
simpatia de uma parte da população, jogo no qual nossos políticos são mestres,
tapar sóis com peneiras. Então o que fazer e como impedir que a reprodução de
tal tipo de ataques se torne um problema recorrente?
Um recente relatório divulgado
pelo Serviço Secreto dos Estados Unidos, país que há anos lida com tais
eventos, aponta que “a violência direcionada é evitável se as comunidades
tiverem as informações e os recursos certos para reconhecer sinais de alerta e
intervir". Então, mais do focar em aumento de efetivo ou controle
de mídias é necessário que sejam desenvolvidas estratégias de identificação e
resolução de prováveis problemas.
Tal relatório aponta que a
maioria dos agressores já apresentou algum histórico de comportamento que
preocupou pessoas próximas, com temor pela segurança própria ou de terceiros,
muitos já tinham registros de participação em atos de violência (criminal ou
doméstica) ou intimidação, não raro com passagem pela polícia por crimes ou
agressões. Metade desses agressores buscavam retaliação por erros relacionados
a questões pessoais, domésticas ou no local de trabalho, tendo experimentado
eventos estressantes logo antes de perpetrar os eventos. A maioria tinha algum
problema relacionada a problemas de saúde mental e, apesar das narrativas
dominantes atualmente na mídia, apenas 25% tinham motivações relacionadas a
algum sistema de crença ideológica (antissemita, misógina, racial, extremista
ou antigoverno).
Muitos dos perpetradores de
agressões em locais públicos como escolas, costumam ter em sua biografia
episódios de vitimização por bullying ou outros motivos, problemas de
relacionamento no local de trabalho, de relacionamentos passados ou atuais,
finanças e saúde. Eles costumam se preparar com antecedência, buscando
relacionar etapas a serem seguidas, conhecer o local, coletar material para
causar danos, pesquisar ataques ocorridos anteriormente e frequentemente
costumam comentar sobre tais planos com alguém próximo.
É possível então intuir que a
prevenção a tais atos começa muito antes de medidas mirabolantes e publicitárias.
É preciso investir de verdade em participação familiar e educacional nas
escolas, com programas competentes de combate a intolerância e discriminação,
sem ideologias partidárias ou falaciosas, mas que tenham base na compreensão e
aceitação de diferenças, na discussão saudável de ideia e na responsabilização
individualizada e padronizada de tais atores.
Aqui, abro um breve parênteses
para dizer que em relação a responsabilização de atos criminais é necessário
também se discutir a punição de menores de 18 anos, sim, tema polêmico, mas
extremamente necessário. Não é mais possível fechar os olhos a enorme
participação de adolescentes em atos infracionais graves, cuja correção hoje
existente só faz aumentar o risco que incide sobre essa parcela de nossa
sociedade, basta ver quem mais morre e quem mais mata em nossas fronteiras,
jovens entre 14 e 25 anos. Cooptados por organizações criminosas que abusam da
facilidade com que tais jovens são eximidos de seus atos. Claro, A punição deve
diferir daquela dada a um adulto, mas ela não pode mais ser considerada apenas
análoga a um crime, mas vista como um e punível como um. Que se atenue a pena
em razão da condição individual, mas essa discussão fica pra outro momento.
Voltando a temática, penso que
criar instrumentos que fortaleçam a disciplina nas escolas, fazendo ver aos
jovens a sua responsabilidade e fomentando o pertencimento a sua comunidade
escolar, com regras estabelecidas e transparentes, que reverberem no estudante
a noção de civilidade, civismo, fraternidade, mérito e compreensão sobre o
próximo, são um caminho que pode ser trilhado de forma conclusiva para prevenir
e evitar a propagação de tais atitudes.
A comunidade deve estar atenta a
indivíduos que apresentem comportamento errático, violento, depressivo, com
interesse extremo em situações de violência. As escolas devem investir na
preparação de seus profissionais na identificação e resolução de potenciais
problemas e é necessário que o devido encaminhamento seja dado ao fato pontual,
através de acompanhamento psicossocial, orientação e aconselhamento e até avaliação
pelos órgãos de segurança se necessário.
O monitoramento constante dos
alunos no ambiente escolar, tal como é feito nas escolas com foco em
disciplina, com o frequente estímulo ao desenvolvimento de valores familiares,
fraternos, morais, cívicos e humanos é algo que tem feito falta em nossa atual
sociedade que se volta cada vez mais para o interior do mundo digital, onde o
distanciamento é a regra, onde limites podem ser quebrados sem consequências
imediatas e muitas vezes, sem estas. Tais escolas, entretanto, não são bem
vistas pelo status quo vigente, que, via de regra, não as conhece a fundo,
optando pela crítica ideológica pura.
O modelo disciplinar, porém, pode
ser adaptado a qualquer tipo de escola, bastando que haja compromisso e
treinamento dos profissionais, bem como a implantação de um sistema de regras
que seja transparente, possível e responsabilizador. O jovem precisa, desde
cedo ter noções de compromisso familiar, comunitário e social, para que possa
desenvolver em si senso de cidadania, cuidado pelo outro e orgulho pátrio.
Pais precisam se aproximar mais
dos filhos, monitorar o que eles fazem nas redes sociais, conhecer seus amigos,
dar limites claros e cobrar respeito e responsabilidade, conversar, observar,
se interessar pelas atividade deles, fazer inspeções surpresas em seus objetos
e coisas pessoais, não invadindo privacidades, mas sendo pais.
Valores familiares, culturais e
sociais parecem estar fora de moda. Quando se fala em disciplina muita gente
ouve repressão, atraso, mas sem ela, a disciplina, o ser humano não progride,
ao contrário, fica como um cão correndo no mesmo lugar atrás da cauda. Cobrar
responsabilidades é algo a que nos desacostumamos, principalmente quando vemos
autoridades que não respondem por seus atos, insegurança jurídica dificultando
entendimentos sobre que posturas são ou não legais, sensação de impunidade
vista diariamente através de decisões no mínimo estranhas propaladas na
justiça, falta de planejamento de estado a longo prazo, etc.
É preciso pensar com cuidado que
tipo de país queremos para nossos filhos e netos, investir maciçamente em
educação de qualidade, em formação técnica, geração de empregos, em melhoria
social e em igualdade de oportunidades. É preciso combater intolerância de
qualquer tipo, ensinar as crianças a conviver em harmonia com as diferenças,
entender que cada um de nós é um universo em busca de respeito e dignidade.